Bowie. For ever and ever.

Como as pessoas experimentam a morte?  Que pensamentos habitam o cérebro quando estamos nas curvas finais da existência?  Todos sabemos da nossa impermanência no plano terreno, mas ninguém se atreve sequer a pensar nesse processo.  É quase um tabú, proibido falar em público.  David Bowie, na genialidade que sempre o acompanhou, trouxe o tema para o primeiro plano de maneira voraz, feroz, brutal e belíssima! Aliás, como tudo o que arquitetou e projetou em vida e na morte.

Eu nem lembro qual foi o momento que o vi pela primeira vez.  Deve ter sido lá pelos anos oitenta.  This is not America (com Pat Metheny Group), Let’s Dance, Never Let Me Down, Blue Jean, Heroes.  Na época que vi Ashes to Ashes, Sound and Vision, Changes, Life on Mars e Space Oddity, já havia me possuído!  Fiquei encantada com o fato de ele parecer de outro planeta, outsider, freak, exilado do mundo.  Ele era a própria voz de pessoas como eu que estavam na busca de si mesmas neste sistema que parecia lunar.  Eu, uma menina na pequena cidade do Panamá, que nunca tinha pegado um avião, ou que nunca havia atravesado o oceano, ainda com muito que viver.  Essa voz caleidoscópica que ecoava pelas rádios, na televisão, nas fitas cassettes e que falava com esse tom grave sobre desilusão, pertencimento, abandono, amor.

Fast forward para setembro de 1990.  Eu, já tinha adotado o Brasil como minha segunda pátria.  Bowie se apresentou no estádio do Palmeiras e eu estava lá.  Era o Sound and Vision Tour.  Paulo estava trabalhando e tinha conseguido ingresso para mim, sabendo da minha idolatria. Davy Jones, The Thin White Duke, Aladdin Sane, Ziggy Stardust, Halloween Jack, Major Tom, Mr. Newton. David Bowie. Inesquecível.

Foi com esses pensamentos fervilhando na minha cabeça (e umas doses de vodka), pensando no Bowie, como um eterno adeus ao Deus, que assisti Lazarus.

Ten, Nine, Eight, Seven, Six, Five, Four, Three, Two, One, Lift off…

lazarus foto 2                                                       Foto divulgação: Flavia Canavarro

Peguei umas pílulas de proteína, botei o meu capacete e lá fomos, meu amigo Mr. K. e eu ver o que estivemos esperando para assistir fazia umas semanas.  Lazarus.  O musical escrito por David Bowie e o dramaturgo irlandês, Enda Walsh, foi inspirado no livro O Homem que Caiu na Terra, de Walter Tevis.  São dezoito músicas escolhidas pelo próprio Bowie, narrando a eterna busca do homem por si mesmo e o seu lugar no mundo, mesmo que ele tenha só 365 dias para descobrir o que fará nesse seu derradeiro ano.

A montagem brasileira teve um time à altura.  Direção geral de Felipe Hirsch, direção de arte de Daniela Thomas e Felipe Tassara, direção musical e arranjos de Maria Beraldo e Mariá Portugal, e um elenco encabeçado por Jesuita Barbosa, Bruna Guerin, Carla Salle, Erom Cordeiro, Luci Salutes, Natasha Jascalevich, Olivia Torres, Rafael Losso e Valentina Herszage.

Que presente.  Um presente de David para todos os que brilham cada vez que escutam as suas músicas, para aqueles que agora tem uma voz e que ainda lutam para encontrar um lugar nesse espaço cada vez mais esquisito.  Lazarus é una historia de morte, de amor, uma história cósmica, uma experiência mental.  Tempo e espaço sem ordem definida.

“All things begin and end in eternity”.

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